“Entre o Tribunal e o Ponto de Ônibus”

| Créditos: Reprodução/Facebook

Querido leitor, sei que a essa altura muitos só falam da desistência de Eduardo Bolsonaro e da dança das cadeiras no tabuleiro político. Mas vamos dar um respiro, deixar a direita, a esquerda e até o Xandão de lado por um instante. Porque, enquanto nos distraímos com manchetes escandalosas, outras decisões, mais silenciosas, mas não menos impactantes, estão sendo tomadas.

Hoje, por exemplo, dois acontecimentos passaram quase despercebidos. Dois julgamentos, duas votações, dois pesos, duas medidas.

 Deixemos, por um instante, os embates ideológicos e os holofotes nacionais, e lancemos um olhar mais atento ao nosso chão, à nossa Campo Grande, ao nosso Mato Grosso do Sul.

Hoje, enquanto o país debatia seus temas candentes, duas votações silenciosas, porém significativas, ocorreram em nossos bastidores. Na Assembleia Legislativa, ecoou um “sim” em primeira instância a um projeto que busca regulamentar um reajuste de nada menos que 89% para os gestores dos conselheiros do Tribunal de Contas do Estado. Um aumento concedido ao longo de quase duas décadas, sem o amparo legal necessário, e que a Justiça havia momentaneamente freado. Agora, a engrenagem legislativa tenta dar forma legal a essa generosa correção. Confesso que a cifra me soa um tanto… expressiva. Em tempos de cintos apertados para a maioria, um reajuste dessa magnitude para cargos já de alta responsabilidade levanta inevitáveis questionamentos sobre prioridades e a percepção de justiça.

Enquanto isso, na Câmara Municipal, a notícia que ecoou foi um sonoro “não”. O veto do Executivo ao projeto de lei que visava garantir a gratuidade no transporte público para mulheres vítimas de violência, durante o delicado período de seus atendimentos médicos, psicológicos e judiciais, foi mantido pelos vereadores. A intenção era nobre, um gesto concreto de apoio a quem já carrega o peso da violência. A negativa, embasada em argumentos técnicos e financeiros, nos deixa com uma ponta de amargura. Imaginemos a dificuldade dessas mulheres, já fragilizadas, tendo que arcar com mais essa barreira para buscar o apoio necessário. A gratuidade no transporte, nesse contexto, seria mais do que uma mera facilidade, seria um símbolo de acolhimento e um passo prático rumo à recuperação.

 ISSO É JUSTO?

Em meio ao calor das discussões nacionais, talvez seja fundamental voltarmos nosso olhar para as pequenas engrenagens que movem o nosso dia a dia, para as decisões que impactam diretamente a vida dos nossos vizinhos. Pois, no fim das contas, a justiça, assim como a política, se faz no micro, nas escolhas que moldam a nossa realidade mais próxima.

De um lado, um reajuste milionário, aparentemente essencial e urgente. Do outro, um benefício para vítimas de violência, considerado dispensável.

Com a devida reflexão,

Alcina Reis.

Jornalista Alcina Reis | Créditos: Arquivo pessoal

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