Mais da metade dos postos de saúde do país tem só um médico

| Créditos: Foto: Agência Brasil


Enquanto o governo federal aposta em medidas para destravar as filas do Sistema Único de Saúde (SUS), a rede de atenção básica — considerada a porta de entrada do sistema — sofre com deficiências estruturais, revelou o Censo das Unidades Básicas de Saúde de 2025, do Ministério da Saúde. Os dados apontam que 26,6 mil (59,3%) das 44,9 mil unidades em funcionamento no país contam com apenas um médico, e 27 mil (60,1%) precisam de algum tipo de reforma estrutural.

Segundo o censo, 1.724 unidades não possuem nenhum médico, quase metade delas concentrada na região Nordeste. Por outro lado, as UBS com quatro ou mais médicos — que representam 15,1% do total — estão majoritariamente no Sudeste. O levantamento foi realizado em todas as unidades do país entre junho e setembro de 2024.

A rede de atenção básica é responsável por serviços primários de saúde, como prevenção, diagnóstico e tratamento de doenças. A maioria dos postos de saúde é composta por uma única equipe de Saúde da Família, formada por médico, enfermeiro e agentes comunitários. De acordo com o levantamento, 88,4% das unidades têm apenas uma equipe, o que explica a presença de apenas um médico por unidade na maioria dos casos.

Um exemplo é a UBS 19 de São Sebastião, no Distrito Federal, que atende cerca de 5 mil pessoas da região. Funcionários relatam que, em períodos de licença ou férias do único médico da unidade, não há substituto, o que leva à suspensão das consultas e ao encaminhamento de pacientes para outras unidades.

Para o presidente da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC), Fabiano Guimarães, a presença de ao menos uma equipe por unidade é positiva. No entanto, ele alerta que, em unidades com alta demanda, ter apenas um médico é preocupante.

— Em pequenos municípios, que têm uma população mais reduzida, o mais importante é ter um médico na unidade atendendo as pessoas. Isso não é ruim, desde que essa unidade básica atenda cerca de 3 mil a 3.500 pessoas. O problema é ter uma UBS com 10 mil pessoas atendidas por um único médico — afirma.

Falta de equipamentos

O censo também apontou deficiências importantes na infraestrutura e nos equipamentos das unidades. Segundo o levantamento, 60,1% das UBSs afirmaram precisar de reformas estruturais.

Além disso, 57% não possuem oxigênio, usado em procedimentos de nebulização ou para o transporte de pacientes em casos mais graves. A pesquisa identificou ainda que apenas 19,7% das unidades realizam a inserção de DIU, procedimento considerado essencial para ampliar o acesso a métodos contraceptivos.

— O censo é fundamental para identificar pontos críticos. Ter oxigênio é essencial, assim como dispor de aparelho de eletrocardiograma e profissionais capacitados para inserir DIU na unidade — comenta o presidente da SBMFC.

Em nota, o Ministério da Saúde informou que o programa Novo PAC Saúde prevê 135 entregas de obras até o final de 2025 e a distribuição de 10 mil kits com 18 equipamentos cada para fortalecer a estrutura das unidades.

Para um dos coordenadores do censo e pesquisador da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Luiz Facchini, as informações “são fundamentais para orientar os esforços dos gestores municipais e o apoio dos estados e da União”.

Impacto nas filas

A qualificação dos médicos que atuam na atenção básica pode contribuir para melhorar o fluxo de atendimento no sistema, afirmou o presidente da SBMFC. Guimarães argumenta que profissionais especializados em Medicina de Família e Comunidade tendem a encaminhar menos pacientes para especialistas, o que impacta diretamente nas filas do SUS.

— Uma forma de atacar o problema das filas para especialistas é ter um profissional bem capacitado na UBS, especializado em Medicina de Família e Comunidade, que encaminhará ao médico especialista somente quando necessário. Essa é uma das formas de abordar o problema. O número de especialistas nas unidades básicas é pequeno.

Nos últimos meses, o governo tem se dedicado ao programa Agora Tem Especialistas, política que Lula define como sua “obsessão” para diminuir o tempo de espera por cirurgias e consultas no SUS. O plano prevê parcerias com hospitais particulares e a distribuição de carretas de atendimento para amenizar o principal gargalo do SUS até o final do próximo ano.

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