Em meio à pressa cotidiana, aos compromissos inadiáveis e à aparente secularização da sociedade, a celebração de Corpus Christi ainda resiste como um símbolo de fé e pausa. Mais do que um feriado prolongado, a data cristã convida à reflexão sobre o que permanece sagrado em nossas vidas — mesmo quando tudo ao redor parece desacralizado.

O costume de enfeitar as ruas com tapetes coloridos, por onde passa a procissão do Corpo de Cristo, ainda sobrevive em muitas cidades brasileiras. Mas, em outras, essa tradição vem sendo reduzida a eventos pontuais, muitas vezes restritos ao entorno das igrejas. Em alguns lugares, Corpus Christi virou apenas sinônimo de trânsito alterado, comércios fechados ou oportunidade de viagem.

No entanto, o significado da data vai além da religiosidade. Celebrar o Corpo de Cristo é também celebrar a partilha, a presença e a união. Em tempos de individualismo, discursos polarizados e intolerância, a ideia de um Deus que se faz pão para estar entre os homens pode (e deve) inspirar pontes de reconciliação. Talvez o maior desafio hoje seja justamente transformar símbolos em atitudes, fé em ações concretas de solidariedade e cuidado com o outro.

A data é também uma oportunidade para que a sociedade repense seus próprios rituais e prioridades. O que estamos celebrando quando celebramos? E, sobretudo, o que deixamos de celebrar quando esquecemos o sentido do coletivo, da comunhão, do estar junto — não apenas em templos, mas nas ruas, nos lares, nas redes de apoio?

Que esta solenidade nos inspire a reconhecer Cristo não apenas no pão consagrado, mas também no rosto do faminto, do migrante, do doente e do excluído. Que nossa adoração não se limite às igrejas, mas se traduza em gestos concretos de caridade e justiça. Afinal, como disse São João Crisóstomo: "Queres honrar o Corpo de Cristo? Não o desprezes quando o encontras nu nos pobres."

Neste Corpus Christi, que possamos renovar nossa fé, nossa unidade e nosso compromisso com um mundo mais fraterno. Que o Cristo Eucarístico nos una, não apenas em devoção, mas em ação.

Feliz Corpus Christi!

Por Alcina Reis