Militares mantêm benefícios mesmo gerando rombo de R$ 50 bi na Previdência
- porUOL
- 10 de Dezembro / 2024
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Imagem ilustrativa: Lula, os comandantes das Forças Armadas e José Múcio, ministro da Defesa | Créditos: Imagem: Ricardo Stuckert
O governo Lula deixou praticamente intocados benefícios das Forças Armadas no pacote para conter gastos públicos, apesar de a aposentadoria militar responder por um rombo de R$ 50 bilhões e ser, proporcionalmente, o maior déficit da Previdência.
Privilégios das Forças Armadas foram alvo de críticas após divulgação de vídeo da Marinha. A peça institucional intercala imagens de oficiais de baixa patente em treinamento militar com a de cidadãos civis em momentos de lazer. O vídeo termina com a pergunta: "Privilégios?". A peça foi ajustada de última hora para reagir à inclusão militar nos cortes do governo, apurou a colunista do UOL Raquel Landim.
No fim das contas, a proposta do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mexe pouco nos benefícios das Forças Armadas. Elas devem contribuir com R$ 2 bilhões dos R$ 70 bilhões que serão economizados em dois anos. O ajuste atinge apenas três pontos:
Fim do pagamento da pensão para os "mortos fictícios" (morte ficta). Até hoje, familiares de militares expulsos das Forças por crimes ou infrações recebem pensão. A Folha revelou que, só no Exército, o pagamento ultrapassa R$ 20 milhões por ano.
Fim da transferência de pensão para dependentes. Depois de usufruída por cônjuges e filhos, a pensão pode ser transferida a parentes mais afastados, como irmãos, em caso de morte de familiar mais próximo.
Pagamento de 3,5% da remuneração militar para o fundo de saúde militar. O percentual, que podia ser menor dependendo da patente, precisará ser pago igualmente por todos.
Idade mínima para entrar na reserva. Se o pacote de Haddad for aprovado, os militares precisarão ter 55 anos para entrar na reserva com salário integral, mas com um prazo de transição até 2032.
Especialista vê mudanças "muito tímidas". "Mesmo a questão da morte ficta, que é moralizante, me parece uma nuvem de poeira", afirma o economista Pedro Fernando Nery, professor do IDP (Instituto Brasileiro de Ensino).
O impacto é quase irrelevante, já que pouca gente é expulsa da Forças (...) Mas passa a impressão de que cederam, de que excessos estão sendo corrigidos. Não estão.
Pedro Fernando Nery, economista
Os benefícios dos militares
Além dos benefícios que serão alvo do ajuste, há outros. Eles envolvem sobretudo acúmulo de adicionais ao salário militar e a manutenção do soldo após a ida para a reserva, ou aposentadoria. Além do soldo, a remuneração dos militares é composta por adicionais de:
Compensação por disponibilidade militar: varia de 5% a 41% a depender da patente, e se refere à dedicação exclusiva ao serviço militar e à necessidade de sempre precisar estar disponível.
Tempo de serviço: a cada ano de serviço, o militar recebe 1% a mais sobre o soldo, dependendo da patente.
Compensação orgânica: compensa o desgaste físico de algumas atividades militares, como mergulho e salto de paraquedas. Varia de 10% a 20%, dependendo da patente.
Permanência: o militar que pode ir para a reserva e escolhe continuar em atividade recebe mais 5% do soldo e mais 5% a cada promoção.
Habilitação: para receber, o militar precisa realizar curso de especialização. Conforme o número e o tipo, maior é o percentual repassado, que varia de 12% a 30% do soldo.
Militar: a medida provisória que o regulamentou, em 2001, diz apenas que o valor se refere a uma "parcela remuneratória mensal devida ao militar, inerente a cada círculo hierárquico da carreira". Varia de 13% a 28% sobre o soldo. Ganha mais quem tem patente maior.
Esses adicionais mais do que dobram os salários no topo da hierarquia militar. O soldo para o general do Exército, tenente-brigadeiro do ar ou almirante de esquadra é de R$ 13,4 mil, mas pode chegar a R$ 28,3 mil com os aditivos.
Os adicionais causam rombo no sistema previdenciário. Diferentemente de servidores civis e trabalhadores da iniciativa privada, que em geral recebem aposentadoria proporcional à média dos salários ao longo da carreira, os militares vão para a reserva ganhado integralmente seu último soldo, acrescido dos adicionais a que tinham direito.
Reforma em 2003 acabou com a integralidade para servidores civis. "Ela ainda existe para os que entraram no serviço público até 2003, mas, depois dessa data, o cálculo foi ficando proporcional", afirma Nery. "Para o INSS, não existe nada parecido. O ideal ia ser fazer agora algo parecido: quem já entrou antes da mudança segue com o direito, e muda daqui para frente. Gradualmente, o déficit diminui."
Os militares se aposentam cedo e, na reserva, recebem os mesmos reajustes concedidos aos da ativa. Até que a proposta de Haddad seja aprovada pelo Congresso, o militar não tem idade mínima para se aposentar. Ele vai para a reserva com o salário integral, se tiver servido por 35 anos. O ajuste do governo prevê que o militar precisará ter 55 anos para se aposentar, mas só a partir de 2032. Hoje é comum militares se aposentarem na casa dos 40 anos.