Entenda em 4 pontos o depoimento de Freire Gomes ao STF

Depoimento do general Freire Gomes teve cerca de duas horas de duração | Créditos: ISAC NÓBREGA/PR


O general Marco Antônio Freire Gomes, ex-comandante do Exército, prestou nesta segunda-feira (19) mais de duas horas de depoimento ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Durante a audiência, ele foi advertido pelo ministro Alexandre de Moraes por apresentar contradições em relação ao que havia dito anteriormente à Polícia Federal (PF).

Freire Gomes é considerado testemunha-chave na investigação que apura se o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tentou articular um golpe de Estado após perder as eleições em 2022. Bolsonaro acompanhou o depoimento por videoconferência.

Veja a seguir os quatro principais pontos do depoimento do general Freire Gomes:

1. “O Exército não violaria a Constituição”

Freire Gomes relatou que o então presidente Jair Bolsonaro chegou a apresentar decretos que mencionavam estado de sítio e o uso das Forças Armadas por meio da Garantia da Lei e da Ordem (GLO).

Segundo o general, os textos estavam baseados na Constituição, mas ele alertou Bolsonaro de que o Exército não participaria de nenhuma ação fora da legalidade.

“O principal aspecto é que justamente aquilo que competiria ao Exército, nós não vislumbrávamos como poderíamos participar disso”, afirmou o general.

Freire Gomes explicou que deixou claro ao presidente que medidas sem apoio político, jurídico e internacional poderiam gerar sérias consequências legais.

Eu alertei que se ele saísse dos aspectos jurídicos não só não contaria com nosso apoio como poderia responder juridicamente. Ele concordou e o assunto ficou por isso

General Marco Antônio Freire Gomes em depoimento ao Supremo Tribunal Federal (STF)

2. Minuta golpista foi apresentada como “estudo”

Questionado sobre a minuta de golpe, Freire Gomes disse que Bolsonaro apresentou o conteúdo como um “estudo” jurídico, e não como uma proposta concreta de ação.

Por isso, segundo o general, o alto comando das Forças Armadas não teria se alarmado naquele momento.

“Talvez ele tenha nos apresentado por questão de consideração por alguns trechos do documento dizer respeito a estado de defesa, GLO [Garantia de Lei e da Ordem]. Estava nos dando conhecimento de que iria começar esses estudos.”

Freire Gomes disse que o documento foi sendo “aperfeiçoado” ao longo do tempo, mas reforçou que, mesmo que tivesse base legal, o Exército não apoiaria ações que extrapolassem seus limites constitucionais.

O general também negou que tenha dado voz de prisão a Bolsonaro, como foi divulgado anteriormente pela imprensa.

“Alguns veículos relataram que eu teria dado voz de prisão ao ex-presidente, mas isso não aconteceu.”

Segundo ele, esse momento foi testemunhado pelo então comandante da Força Aérea Brasileira, Carlos Baptista Júnior, e relatado à Polícia Federal.

3. Críticas ao sistema eleitoral e silêncio dos comandantes

Freire Gomes relatou que participou de uma reunião ministerial com Bolsonaro, na presença dos comandantes das Três Forças — Exército, Marinha e Aeronáutica.

Ele descreveu o encontro como “iminentemente político”, no qual foram feitas críticas ao sistema eleitoral brasileiro.

Nenhum dos comandantes, porém, se manifestou, ainda segundo relato de Freire Gomes.

O general reforçou que não foi identificada fraude nas eleições.

“A premissa que nos foi passada em relação a essa comissão era apurar vulnerabilidades como um todo. Não necessariamente fraude.”

Em outra reunião, no dia 7 de setembro de 2022, no Palácio da Alvorada, Bolsonaro apresentou a chamada minuta do golpe por meio do assessor Felipe Martins, ainda de acordo com Freire Gomes.

Os comandantes não foram informados previamente sobre o assunto e, também segundo Freire Gomes, o presidente apenas disse que estava estudando o tema juridicamente.

“Tivemos diversas reuniões, obviamente cada um expressava sua opinião quando perguntada pelo presidente. Eu estava focado na minha lealdade de ser franco ao presidente.”

Sobre os demais presentes, o general afirmou que o brigadeiro Baptista Júnior foi contrário a qualquer ação fora da legalidade.

Já o almirante Garnier, comandante da Marinha, não teria expressado apoio nem oposição. Ao ouvir isso, Moraes repreendeu o general.

A testemunha não pode omitir o que sabe, vou dar uma chance de a testemunha dizer a verdade. Se mentiu na Polícia, admite aqui. […] Pense bem antes de responder, porque na PF o senhor disse que Junior e Garnier manifestaram expressamente apoio.

Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)

4. Pressão sobre o general e tentativa de ruptura

Freire Gomes afirmou que sofreu pressões para aderir ao plano golpista e relatou ataques pessoais, inclusive contra seus familiares.

“Sim senhor, eu comecei a sofrer ataques e por sinal continuo sofrendo”, disse.

“Fui atacado, ofendido, minha família atacada, ficou bastante afetada por isso. Meu filho mesmo, dizem que ele é informante do Alexandre de Moraes”, acrescentou.

Segundo a Polícia Federal, a recusa do general foi decisiva para impedir o avanço da tentativa de ruptura. Ele e o comandante da Aeronáutica, Baptista Júnior, teriam se posicionado contra o golpe.

Já o comandante da Marinha, Almir Garnier, teria aderido à proposta, também de acordo com a PF.

Com isso, Bolsonaro teria buscado apoio do general Estevam Theóphilo, do Comando de Operações Terrestres (COTER).

Freire Gomes relatou ainda a existência de uma carta, redigida por militares, com o objetivo de pressioná-lo a aderir ao golpe.

Ele classificou o documento como inaceitável.

A carta, segundo ele, foi uma tentativa clara de ruptura: “Sem dúvida”.

Ele afirmou também que o texto contrariava os princípios da hierarquia militar, uma vez que militares da ativa não devem se manifestar politicamente.

Três militares foram responsabilizados pela autoria da carta: o coronel da ativa Anderson Lima de Moura, e os coronéis da reserva Carlos Giovani Delevati Pasini e José Otávio Machado Rezo, ambos da reserva.

Compartilhe: